sábado, 24 de maio de 2014

No que pensam as crianças?

     A receita de pudim de micro-ondas em um sábado à tarde cheio de fome. A ansiedade do fogo que não acende para que os sanduíches grelhem. O amor pelo arroz e feijão, o arroz por baixo, o feijão por cima. O ódio aos legumes e às saladas. A defesa do churrasco, a defesa da salada. O incrível patê de azeitona em meio ao insosso desfile de salgadinhos convencionais.
   A defesa da Copa, a condenação da Copa. Política, a distribuição dos poderes no mundo, o sensacionalismo dos sangrentos jornais vespertinos na tevê. O conservadorismo do sistema escolar. A maldade que toma conta do centro da cidade. O orelhão solitário e esquecido no meio da rua. O dinheiro perdido.  A casa solitária entre prédios. A noite barulhenta, que não deixa descansar.
   A tarefa cotidiana, a vida cotidiana, os dias iguais e sempre diferentes, a luta contra si mesmo, a descoberta de quem se é. As tarefas de português, a obrigação de escrever, as loucuras do professor querido, a escola, as chatices da escola, as dificuldades da escola. Os sonhos, as histórias de criança, o medo de injeção, a conquista do machado. As pombas na rua.
    A velha rabugenta.
   Os gatos, os pais, as mães, as namoradas dos pais, os namorados das mães.  A amizade. O pum do amigo. Os desenhos animados de antigamente, como eram melhores. As brincadeiras com os amigos, os trocadilhos idiotas com amigos, as conversas com amigos. Como é bom ter amigos.
   As mudanças. Mudança de casa, mudança de escola, mudança de cidade. A janela na frente do prédio, os espaços vazios da noite, o terreno abandonado. O mendigo na rua, o velho que nos olha, o prédio em construção, a gente em construção. A família no shopping, as músicas. Das garotinhas na escola à saída de casa. 
    No que pensam as crianças?
   Sei que poucas vezes vi escritos tão sinceros e, por isso mesmo, tão legais. Sei que as coisas são como são, que não me venha pedir, Luana, para dar uma mensagem ou densidade maior ao que contei, o que contei era isso, desse tamanho, não tem como desenvolver mais. Ou venha ver, Luana, se essa imagem está boa, dá uma ideia, vê se assim ficou claro. Por que não posso escrever palavrões, por que não posso escrever textos curtos, por que sou obrigado a escrever? Não tenho do que falar, não sei, não quero, quis causar reflexão, quis que rissem, gosto de escrever textos engraçados. Minha mãe falou que meu texto tem profundidade. Luana, você leu o texto que eu postei no blog? Ficou legal? Escrevi mais três crônicas ontem, você leu? Aos poucos fui me soltando, não critica a crônica dele, está super legal. Não revisei porque fico com preguiça. Eu gostei de escrever crônicas. Foi legal porque cada um encontrou o seu estilo. Encontrei minha crônica no banheiro. Na rua. Encontrei minha crônica na escada. Na lembrança.
   E como foi legal conhecer e ver nascer esses novos cronistas modernos, e ler os blogs e dialogar sobre a escrita, a crônica, a revisão, o uso da crase, o registro do quase nada que é tudo.
   E como é legal, sempre, acompanhar essas crianças juntando palha, crescendo, aprendendo e suando nos porquês para, um dia, construírem seus próprios ninhos.

  
P.S.: Acho que esse é o último ano em que ainda é possível chamá-los de crianças. Resolvi aproveitar. 

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Blogueiros equipanos 2014

E já se passaram quatro anos.

Os primeiros a criar seus blogs e colocá-los na rede agora estão no terceiro terceiro ano do ensino médio, prontinhos (ou não, mas fazer o quê?) para sair da escola, entrar na vida, e tudo o mais. Estão ali, por exemplo, os blogs de quase todos os alunos monitores do Ranieri deste ano, é só procurar. Alguns apagam suas páginas, outros dão continuidade, outros deixam lá mas morrem de vergonha se sabem que eu andei lendo alguma crônica deles por aí (não é, Lúmina?)

O fato é que a internet, que tem fama de tão rápida e passageira, aqui agrega tempos, e deixa que as turmas se encontrem. Cada turma dessas tem também um livro de crônicas, e os livros estão talvez em estantes de pais avós e mães orgulhosas, em baús de guardados, na cabeceira de alguém. Aqui fica uma estante acessível a todos, pedacinhos da existência de cada um, com tropeços, acertos, imagens e textos, legais ou não.

Fico achando bacana, esse projeto. Tenho saudades dos alunos que passam e renovo minha vontade de ser professora a cada turma que entra. Minha vontade de ler os textos de cada um e ajudá-los no domínio e compreensão da nossa língua escrita.

Ontem, 31 de março, aprendi novamente com meu grande professor de redação, o Gilson Rampazzo. Ele comentou como a liberdade foi uma conquista de toda uma geração, muito generosa, que não achava que dava para ficar bem com tanta gente em volta passando mal, seja pela desigualdade, falta de liberdade ou injustiça.

Neste ano esse projeto fica sendo em homenagem a eles , a essa geração generosa que lutou tanto e sofreu tanto para que grandes coisas como a democracia e pequenas coisas, como projetos como esse, no qual jovens escrevem e publicam textos sobre o que quer que queiram e pensem, possam acontecer.

Luana.

E aqui, a trilha sonora da aula impossível, a aula sobre música e censura no período da ditadura.

Agradeço ao professor Antonio Carlos que gentilmente me cedeu a sua lista de músicas, a partir da qual essa lista foi feita.
 Há uma certa ordem cronológica, vale a pena prestar atenção nas mudanças que vão ocorrendo, seja no estilo musical, seja no teor das letras, e relacioná-las aos acontecimentos desse período.  Todas as músicas estão linkadas, basta clicar. Trata-se, é claro, de uma amostra. Novas músicas, sugestões e relatos podem ser postados nos comentários, seria bem legal, podemos ampliar cada vez mais a lista.

Bossa Nova no Carniggie Hall
Opinião Nara Leão
Carcará. Maria Bethania.
O Calhambeque. Roberto Carlos
Arrastão. Elis Regina
Disparada. Jair Rodrigues
Alegria, alegria. Caetano Veloso
Domingo no parque. Gilberto Gil
Roda viva. Chico Buarque
Ponteio. Edu Lobo
Viola enluarada. Milton Nascimento
Geraldo Vandré ao vivo no maracanãzinho
Sabiá. Tom Jobim e Chico Buarque
Sinal Fechado. Paulinho da Viola
Tropicália. Caetano Veloso.
Aquele abraço. Gilberto Gil
Não vá se perder por aí. Mutantes
Cálice. Chico Buarque.
País tropical. Wilson Simonal
Apesar de você. Chico Buarque
Cartomante. Ivan Lins
bêbado e a equilibrista. Elis Regina



Blogueiros equipanos 2019

             Há dez anos atrás começava o Projeto Crônicas no oitavo ano do Colégio Equipe. A iniciativa da professora Luana, que criou este...